01.02.2011

À conversa com o Arqº Manuel Taínha

01.02.2011

À conversa com o Arqº Manuel Taínha

‘Nunca fiz nada só para me mostrar, gosto de me reconhecer nas obras que faço e reconheço-me em todas. Fui o melhor que pude ser’

Que características destacaria como mais importantes na relação com os engenheiros da sua equipa de projecto?

A experiência diz-me que o trabalho em grupo não é uma mera justaposição ou soma de competências, de saberes, de personalidades diferentes. É condição necessária que cada parte tenha a capacidade de entender os problemas e os valores que, em cada momento, estão em causa. Por mim, julgo ter essa capacidade, sobretudo em relação às engenharias de estruturas, que mais intimamente se ligam com a arquitectura. E tive a sorte de ter encontrado, ao longo da vida, engenheiros que aceitam o diálogo, com o maior à vontade, e que sabem ‘arregaçar as mangas da camisa’ quando é preciso. É evidente, que no processo de projecto tenha sempre que haver alguém que nunca perca de vista o todo, que é o princípio e o fim de cada projecto. E esse alguém é, naturalmente, o arquitecto que, como tal, tem que saber reconciliar o trabalho das engenharias em função desse mesmo todo. E já que aqui sou hospede da Artes&Letras, devo dizer que encontrei sempre na BETAR a melhor colaboração; primeiro com o Eng. Veiga de Oliveira e depois com o Eng. José Pedro Venâncio. Bons companheiros de Estrada.

E esse entendimento com os engenheiros civis é fundamental…

Sem dúvida. Esse entendimento, direi, essa cumplicidade é uma das coisas que torna o acto de projectar um acto meritório e agradável; mesmo em condições adversas. Projecta-se sempre contra qualquer coisa.

Alexandre Marques Pereira disse, em tempos, que Manuel Taínha é “um dos arquitectos mais completos da história da arquitectura nacional”. Reconhece-se nesta descrição?

Eu gostaria de me reconhecer nessa figura que o Alexandre traça de mim. Não o escondo. Mas não sei. Não vai sem dizer, no entanto, que o viver por dentro o mundo da arquitectura nunca foi para mim uma limitação. Muito pelo contrário, ela deu-me sempre aberturas para outros e variados mundos. Permanentemente, irrevogavelmente. E daí que eu esteja de acordo com Abel Salazar, o médico, quando ele diz que “aquele médico que só se preocupa com a medicina nunca será um bom médico”. Onde se lê médico, leia-se arquitecto. Quanto aos resultados… aí eu serei sempre o pior juíz.

Há uma obra da sua vida?

A obra da minha vida será toda a obra que tenho feito. Tenho sempre a maior relutância em escolher uma. É que, nessa pergunta, sou eu que estou em causa e não as obras. E eu conheço-me mal, conheço-me por choques, de agrado ou desagrado, com a realidade, inclusive com a realidade das obras que faço. Aí não tenho discernimento que chegue para responder, cabalmente, à sua pergunta. Mas creio que não haja mal nenhum nisso.

Se fosse hoje, faria os seus projectos de modo diferente?

Naturalmente que sim. Porque as circunstâncias em que cada projecto acontece variam constantemente. Houve o caso, por exemplo, da escola Professor Herculano de Carvalho, nos Olivais, que foi feita há 30 e tal anos. Quando agora me contrataram para a “reabilitar” e “modernizar”, segundo o programa da Parque Escolar, a concepção geral da escola estava perfeitamente actualizada, pois já então eu via o problema do ensino secundário pelo prisma pelo qual o vêem hoje. Na origem, a escola tinha uma ideia central, bem expressa arquitectonicamente, a qual não deveria ser alterada. E se houve ampliações essas fi-las, maioritariamente, num edifício à parte e completamente diferente. Outro caso foi o da pousada de Santa Bárbara, em Oliveira do Hospital, um projecto feito nos anos 50, que foi posto na gaveta pelo governo de então [Oliveira Salazar]. Passados 10 anos, tiraram-no da gaveta para ser executado e, civilizadamente, o Eng. Ferreira da Cunha, do Ministério das Obras Públicas, peguntou-me se eu queria rever o projecto, dado que tinham passado tantos anos. Aceitei e comecei a revê-lo, alterando aqui, ali e acolá, até que, às tantas, me dei conta de que, com isso, eu estava a destruir a ceoerência do projecto. Então fechei o dossiê e decidi que ele seria realizado tal como estava, com todas as fragilidades que pudesse ter. E assim foi feito. Concerteza que se fosse hoje eu o faria de forma diferente mas, se calhar, nem por isso ficaria melhor.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #17, de Fevereiro de 2011
Crédito fotografia: Público

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