01.03.2021

À conversa com Arq.º Dunga Rebelo

01.03.2021

À conversa com Arq.º Dunga Rebelo

'Trabalhar em Moçambique é estar envolvido em projectos estruturantes e poder ter impacto no desenvolvimento do país. As oportunidades mudam constantemente, obrigam a uma transformação, o que é muito aliciante'

Fale-nos um pouco do seu percurso profissional.

Quando pequeno, desenvolvi uma paixão por desenho. Na escola, passava os intervalos (e algumas aulas) a desenhar, e acabei adquirindo aptidão por Desenho Geométrico. Sabia pouco sobre Arquitectura, mas a oportunidade surgiu através de uma bolsa de estudo para Curitiba, no Brasil. Ao voltar a Moçambique, 7 anos depois, após um curto período por conta própria, juntei-me ao gabinete de Arquitectura José Forjaz Arquitectos, onde fiquei 3 anos e aprendi muito. Contudo, em 2007, a curiosidade pelas outras facetas da indústria de construção levou-me à Épsilon Investimentos, uma empresa Moçambicana com um forte histórico na banca, e com grandes ambições no sector imobiliário, da qual ainda faço parte.

Como encara a relação de dono-de obra com os arquitectos, no contexto de um projecto imobiliário?

A passagem para a promoção imobiliária levou a uma mudança na forma de encarar uma obra. O projecto deixou de ser o foco, e tornou-se um de vários elementos, muitas vezes contraditórios. Mas a formação académica e experiência, tornam o diálogo com os colegas arquitectos mais fluido. A minha abordagem a novos empreendimentos é influenciada por noções de projecto e de planeamento urbano. Graças a essa formação e à oportunidade de ter viajado, ganhei também uma apreciação muito maior pela cidade onde vivo e onde intervimos: Maputo.

Quais são os maiores aliciantes do trabalho em Moçambique?

Trabalhar em Moçambique é estar envolvido em projectos estruturantes e poder ter impacto no desenvolvimento do país. As oportunidades em Moçambique mudam constantemente, reflexo da nossa economia em desenvolvimento, e isso obriga a uma transformação constante, o que é muito aliciante. Na década de 90, Moçambique passou por um momento de privatizações de vários negócios. A Épsilon (na altura SCI) fez um dos primeiros bancos comerciais de Moçambique (o BCI), investiu na agricultura, na indústria de processamento, na mineração e no sal. O mercado imobiliário mudou entre 2000 e 2010. Havia pouca oferta de espaço de qualidade e, com a chegada das multinacionais ligadas à exploração dos recursos naturais, a demanda triplicou. Era um “sellers market” e a Épsilon um dos poucos promotores. O surgimento deste mercado, com elevado grau de exigência e capacidade de pagar rendas altas, impulsionou o mercado.

Quais as maiores dificuldades com que se debate no seu dia a dia?

Inicialmente havia oferta limitada de especialistas nas várias áreas de projecto e fiscalização, pouca diversidade de materiais e de subempreiteiros. Com a crise de 2015, o Metical desvalorizou para menos de metade, os juros duplicaram, ficando o mercado inundado com imóveis recém-construídos, vazios. Mais recentemente surgiram muitos players no mercado imobiliário, com estratégias e preços muito agressivos. E neste último ano, surgiu a pandemia global que afectou negativamente toda a cadeia de valor. Mas talvez o maior desafio para o sector imobiliário seja a ausência de crédito (a taxas sustentáveis) para os compradores, em particular a classe média.

Como conheceu a BETAR e em que é que os engenheiros mais contribuem para as respostas que necessita?

Foi durante a minha estadia na José Forjaz Arquitectos que tive o prazer de conhecer o Eng. Sérgio Mártires, que era uma presença frequente no gabinete. Ao juntar-me a Épsilon, vários dos empreendimentos que desenvolvemos tiveram a BETAR como parte chave da equipa de projecto e mantive sempre um forte contacto com o Eng. Sérgio. Uma das grandes vantagens para nós era o Know How que a BETAR trazia, de soluções e tecnologias novas, pouco conhecidas ou usadas em Moçambique.

Em que áreas tem tido mais trabalho? Qual a sua visão para o futuro de Moçambique?

Após a crise de 2015, o mercado imobiliário entrou em recessão e a Épsilon teve de se readaptar. Acabámos por desenvolver alguma capacidade na prestação de serviços à indústria de Oil & Gas, sobretudo serviços ligados ao desenvolvimento, provisão e gestão de instalações. A maior parte destes projectos são desenvolvidos no Norte do país, onde os desafios de operar são maiores. No entanto, a Épsilon tem ainda um vasto património em Maputo/Matola por desenvolver e continuamos a explorar oportunidades, incluindo potenciais parcerias.
O futuro de Moçambique depende da estabilidade económica e política do país, assim como do impacto global de factores como a Covid e o Aquecimento Global. Contudo, nos próximos anos, a indústria de Oil & Gas terá forte influência no mercado imobiliário, quer pela demanda directa de espaços, quer pelo aumento do dinheiro a circular na economia. Mas acredito que o grande desafio é garantir acesso à habitação segura e digna para o segmento de média e baixa renda, começando com o acesso a crédito. Além do potencial económico, conseguir servir este mercado é fundamental para garantir estabilidade social.

Esta entrevista é parte integrante da Revista Artes & Letras #128, de Março de 2021

Notícias & Entrevistas

01.08.2023

À conversa com os artistas da Exposição de Pintura

O objetivo da mostra de arte organizada pela Betar foi contribuir para a divulgação do trabalho de 15 jovens artistas a quem perguntámos: Como é que a arte surgiu na sua vida? Que significado tem? O que o inspira? Como descreve a sua obra? De que forma o tempo e o lugar têm influência no seu trabalho? O que achou da iniciativa da Betar? E se é difícil promover o trabalho em Portugal? Ler mais

01.03.2013

À conversa com Arq.º Bartolomeu Costa Cabral

‘Sempre tive uma atitude racional nos projectos, achei que não seria um grande arquitecto no aspecto visual, porque a minha segurança é a análise do sítio e do programa, a imagem vem depois.’ Ler mais

01.06.2022

À conversa com Arq.º Gilberto Pedrosa

'Na génese da SPACEGRAM ficou assente a promessa de libertar os projetos das soluções de design mais esperadas ou recicladas, apostando sempre numa abordagem conceptual forte como mote do seu desenvolvimento' Ler mais

Topo

Utilizamos cookies para melhorar a sua experiência de navegação. Ao continuar a aceder a este website está a concordar com a utilização das mesmas. Para mais informações veja a nossa política de cookies.

Portugal 2020 / Compete 2020 / União Europeia - Fundo Europeu do Desenvolvimento Regional